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07 | agosto | 2019

Possibilidade de Trabalho Insalubre por Gestantes e Lactantes após a Reforma Trabalhista

A Lei 13.467 de 2017, conhecida como “Reforma Trabalhista”, alterou diversos dispositivos da CLT, inclusive no que se refere ao adicional de insalubridade, possibilitando, dentre outras alterações, que as gestantes e lactantes que trabalhavam em locais considerados insalubres, ou seja, permanecendo exposta a agentes que prejudicam a saúde, permanecessem executando normalmente as atividades para as quais foram designadas.

Contudo, para as empregadas que trabalhavam em atividades consideradas insalubres em grau máximo, estas eram imediatamente afastadas das atividades, sem prejuízos em sua remuneração. Já para aquelas que estavam expostas aos locais cuja exposição era considerada em grau médio e mínimo, havia a possibilidade de afastamento das referidas atribuições, sendo a trabalhadora designada para outro setor ou função que não exigisse o contato com os agentes insalubres, necessitando, para tanto, uma declaração de seu médico de confiança solicitando a referida alteração.

Observa-se a redação do artigo 394-A da CLT, de acordo com as alterações previstas pela Reforma Trabalhista:

“Art. 394-A.  Sem prejuízo de sua remuneração, nesta incluído o valor do adicional de insalubridade, a empregada deverá ser afastada de:

I – atividades consideradas insalubres em grau máximo, enquanto durar a gestação

II – atividades consideradas insalubres em grau médio ou mínimo, quando apresentar atestado de saúde, emitido por médico de confiança da mulher, que recomende o afastamento durante a gestação”

III – atividades consideradas insalubres em qualquer grau, quando apresentar atestado de saúde, emitido por médico de confiança da mulher, que recomende o afastamento durante a lactação.

A alteração legislativa estabelecida pela Reforma Trabalhista foi prejudicial às gestantes e lactantes, possibilitando o labor em locais considerados como prejudiciais à saúde, colocando em riscos a integridade da trabalhadora e do feto, violando a proteção à maternidade, prevista na Constituição Federal, nos artigos 1°, inciso IV; artigo 6º; artigo 7º, incisos XX e XXII; artigo 170; artigo 193; artigo 196; artigo 201, inciso II; artigo 203, inciso I; e artigo 225.

Verifica-se ainda que com o legislador buscou com a inclusão deste artigo, estimular o trabalho das gestantes e lactantes em local insalubre, ao elencar que o afastamento dessas atribuições apenas seria possível com recomendação médica, sendo ônus da empregada apresentar à empresa uma declaração nesse sentido.

Imperioso destacar ainda que na ausência da apresentação do documento médico, caso houvesse a transferência de posto de trabalho à empregada, esta perderia o direito à percepção do adicional de insalubridade, acarretando uma diminuição em sua remuneração. Assim, para que não fossem afetadas com a redução salarial, muitas mulheres permaneceriam laborando no local gravoso à saúde, acarretando diversas consequências negativas em sua gestação e até mesmo ao bebê.

Destaca-se, nesse sentido, que as empregadas mais afetadas, conforme anteriormente exposto, são aquelas consideradas de baixa renda e escolaridade, haja vista que diante do desconhecimento e possibilidade de redução salarial, deixariam de procurar um médico para solicitar o afastamento, permanecendo em suas atividades gravosas até o final da gestação.

Quanto aos riscos à saúde da gestante e do feto, observa-se o que dispõe o Instituto Alana, ao elaborar a defesa dos direitos das mulheres:

“É fundamental ter em mente que o período gestacional e o momento do nascimento refletem no desenvolvimento infantil: ‘O embrião ou feto reage não só às condições físicas da mãe, aos seus movimentos psíquicos e emocionais, como também aos estímulos do ambiente externo que a afetam. O cuidado com o bem-estar emocional da mãe repercute no ser que ela está gestando. (…) Quando a mulher grávida recebe apoio emocional e material do parceiro e de outros que lhe são próximos durante todo o processo, seus sentimentos de bem-estar comunicam-se ao embrião e ao feto, favorecendo o desenvolvimento saudável do bebê’ (SANTOS, Marcos Davi dos et al. Formação em pré-natal, puerpério e amamentação: práticas ampliadas. São Paulo: Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal, 2014, p. 19). Assim, é importante considerar a relevância da atenção pré-natal e do cuidado com o parto, para além do acompanhamento pediátrico, e entender que violações aos direitos da mulher gestante, parturiente e mãe violam também os direitos de crianças. (…)”

Assim, observa-se que a redação do artigo supratranscrito foi alvo de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal (ADI 5938), pela Confederação Nacional dos Trabalhadores Metalúrgicos, sob o argumento de retrocesso social, haja vista que a proteção às gestantes visa também efetivar a proteção integral do nascituro, resguardando, principalmente sua saúde.

O STF, ao proferir julgamento da ADI anteriormente mencionada, esclareceu que a expressão “quando apresentar atestado de saúde, emitido por médico de confiança da mulher, que recomende o afastamento“, constante nos incisos II e III do artigo 394-A da CLT é inconstitucional, não havendo a necessidade da gestante ou lactante apresentar atestado médico para que seja afastada das condições insalubres de seu trabalho, mantendo o adicional de insalubridade em sua remuneração.

Nesse sentido, verifica-se que a proteção à maternidade e ao nascituro se caracterizam como importante direito social, possibilitando a este, seu pleno desenvolvimento, sem riscos à exposição a ambientes insalubres. A proteção neste estágio é verificada como um direito irrenunciável, não podendo ser afastado por quaisquer motivos.

Observa-se o que dispõe o Ministro Relator, Alexandre de Morais, em seu voto que concedeu a liminar suspendendo a eficácia do dispositivo acima transcrito:

“Sob essa ótica, a proteção da mulher grávida ou da lactante em relação ao trabalho insalubre, caracteriza-se como importante direito social instrumental protetivo tanto da mulher, quanto da criança, pois a ratio das referidas normas não só é salvaguardar direitos sociais da mulher, mas também, efetivar a integral proteção ao recém-nascido, possibilitando sua convivência integral com a mãe, nos primeiros meses de vida, de maneira harmônica e segura e sem os perigos de um ambiente insalubre, consagrada com absoluta prioridade, no artigo 227 do texto constitucional, como dever inclusive da sociedade e do empregador.”

Assim, verificam-se os principais efeitos da decisão anteriormente mencionada: está proibido que gestantes trabalhem em locais insalubres, em qualquer grau, devendo ter sua função alterada e, na hipótese da empresa não possuir outro ambiente para realocá-la, deve afastá-la durante o período da gestação amamentação.

Portanto, com a declaração de inconstitucionalidade de parte dos inciso II e III do artigo 394-A da CLT, verifica-se que as gestantes e lactantes devem ser afastadas de atividades insalubres, em qualquer grau, sem que haja a necessidade de declaração médica expressa nesse sentido, mantendo-se a remuneração, protegendo-se integralmente a maternidade e a criança, salvaguardando a dignidade humana.

Foto Possibilidade de Trabalho Insalubre por Gestantes e Lactantes após a Reforma Trabalhista