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19 | setembro | 2019

Empregador pode descontar prejuízos causados pelo empregado?

A fim de se entender sobre os possíveis descontos efetuados pelo empregador em sede dos prejuízos causados pelo empregado, válido é destacar que a matéria esbarra no salário e ao princípio da intangibilidade salarial (arts. 7º, VI, da CF e 468, da CLT), bem como do risco do negócio empresarial (art. 2º, da CLT).

A aplicação destes princípios é importante pelo fato de que é do empregador o risco de sua atividade econômica, ao qual suporta todos os fatores internos e externos do mercado de trabalho, além do fato de que decorrente disto, os fatores econômicos não devem influenciar o total percebido pelo trabalhador em sua folha de pagamento ou rescisão contratual, ou seja, não há autorização de distribuição de prejuízos a serem suportados pelo empregado, o que comporta exceções, como veremos.

Partindo desta rápida conceituação, chegamos ao artigo 462, da CLT, ao qual destaca que ao empregador não é permitido o desconto aos salários de seus empregados, com a exceção de adiantamentos, previsão legal ou contrato coletivo, neste caso acordos coletivos de trabalho ou convenções coletivas de trabalho, vejamos o caput e o parágrafo primeiro de referido instituto:

“Art. 462 – Ao empregador é vedado efetuar qualquer desconto nos salários do empregado, salvo quando este resultar de adiantamentos, de dispositivos de lei ou de contrato coletivo.

  • 1º – Em caso de dano causado pelo empregado, o desconto será lícito, desde de que esta possibilidade tenha sido acordada ou na ocorrência de dolo do empregado”. 

Verifica-se, pelo disposto acima a vedação ao desconto salarial, e inclusive a exceção legal ao qual o caput faz referência apresentada logo ao parágrafo primeiro, complementando a ideia trazida, explicando qual desconto efetuado pelo empregador se torna possível.

Mediante a análise de referido parágrafo, nota-se que há a previsão de que o desconto pelo prejuízo somente é lícito quando previsto em acordo pelas partes ou ainda na percepção de dolo pelo obreiro, ou seja, somente nestas hipóteses que a empresa ou o empregador podem abater valores do pagamento do trabalhador ou das verbas rescisórias, com a finalidade de cobrir as despesas causadas.

O primeiro aspecto a ser observado é a possibilidade ser acordada pelas partes, uma vez que deve ser previamente ajustada pelos contratantes, muitas das vezes mediante o contrato de trabalho, este que pode ser escrito, tácito ou verbal (arts. 442 e 443, da CLT), contudo, é importante de se ressaltar que referida previsão não poderá ser efetuada de maneira genérica.

Neste acordo entre as partes, é válido se observar que os atos culposos dos empregados podem ser incluídos, em que são destacados por três linhas de ações, sendo elas a imprudência, negligência e a imperícia.

Na imprudência, há a precipitação do empregado, decorrente de ausência de cuidados em seu trabalho e ações. A negligência se caracteriza pela desatenção e descuido, e em muitas oportunidades a indiferença em relação aos resultados de suas ações.

Ainda, na imperícia, o trabalhador não possui a habilidade e conhecimento técnicos necessários para realizar tais atos, contudo mesmo assim o faz, e está muito relacionado com o manuseio de peças ou equipamentos utilizados em seu ambiente laborativo.

No âmbito desses três fatores, quais sejam a negligência, imprudência e imperícia, ainda se verifica a tendência jurisprudencial de que a culpa do trabalhador ao fato ocorrido seja vista como culpa grave, ou seja, há uma intensificação da culpa a fim de que se responsabilize o empregado.

Superada a questão da culpa do trabalhador, nestes três fatores apresentados, está outro requisito para o desconto lícito efetuado pelo empregador, o dolo. Neste, o empregado possui a nítida intenção de causar o prejuízo, contudo, para o empregador é o fator que mais carece de provas, uma vez que deverá ser efetivamente comprovado, a fim de que haja o referido desconto em seu recibo de pagamento.

Desta feita, se verifica, inclusive pelo princípio da alteridade, ao empregador não é permitido o desconto de todos os erros que gerem algum prejuízo econômico, haja vista que pelo art. 2º, da CLT é seu o risco da atividade econômica e da contratação de seus colaboradores.

Um exemplo de referida situação é o de que há o entendimento jurisprudencial de atenuação da rigorosidade da responsabilização obreira em situações em que se denota acidentes com máquinas e equipamentos ao meio ambiente laborativo, haja vista o risco do empreendimento empresarial.

Outrossim, no dia-a-dia, os descontos efetuados pelo empregador são diretamente realizados no salário do trabalhador, em sua folha de pagamento e nos últimos casos, em sua rescisão contratual.

Neste sentido, o Colendo Tribunal Superior do Trabalho, elaborou uma Orientação Jurisprudencial (OJ 18 SDC) em que estipula a limitação máxima de 70% do salário base percebido pelo trabalhador, dado que o mínimo de salário deve ser assegurado ao empregado. Vejamos:

18. DESCONTOS AUTORIZADOS NO SALÁRIO PELO TRABALHADOR. LIMITAÇÃO MÁXIMA DE 70% DO SALÁRIO BASE. (inserida em 25.05.1998)
Os descontos efetuados com base em cláusula de acordo firmado entre as partes não podem ser superiores a 70% do salário base percebido pelo empregado, pois deve-se assegurar um mínimo de salário em espécie ao trabalhador”.

Tal determinação encontra amparo nas decisões unânimes dos anos de 1996 e 1998, em que se observou como fundamento os arts. 82, parágrafo único e 462, da CLT, respectivamente que discorrem sobre o pagamento do salário mínimo em dinheiro que não será inferior a 30% e a possibilidade de desconto pelos prejuízos causados pelo trabalhador de acordo com o discorrido acima.

Referida limitação em porcentagem a ser descontada pelo empregador também encontra amparo de forma análoga perante o art. 1º, parágrafo 1º, da Lei 10.820/2003, em que se verifica que o desconto ao salário do empregado será realizado mediante a sua autorização ao contrato celebrado, no que tange aos pagamentos de empréstimos, financiamentos, operações de arrendamento mercantil e cartões de créditos, sendo o limite máximo de 35% das verbas rescisórias devidas pelo empregador, dos quais 5% são destinados para amortização e saque por meio do cartão de crédito.

Neste aspecto, no que se refere às verbas rescisórias, os descontos efetuados pelo empregador também são válidos, observados o sistema de compensação de valores, a fim de que o TRCT do trabalhador não apresente o valor líquido, ou seja, o resultante da subtração do total de deduções do total bruto, de maneira zerada.

Referido entendimento é previsto também na CLT, em que o parágrafo 5º, do art. 477 determina que qualquer compensação a ser verificada ao pagamento das verbas rescisórias devidas ao obreiro não poderá exceder o equivalente a um mês de remuneração do empregado, dispositivo este que não sofreu alterações com a Reforma Trabalhista.

Assim, pelo exposto, observa-se que os descontos pelos prejuízos ocasionados pelo empregado são possíveis, aos recibos de pagamento e mediante as verbas rescisórias, desde que devidamente acordado pelas partes, inclusive a ser verificada a situação de dolo e culpa do trabalhador.

Tainara Mingorance Lopes

OAB/SP 411.543

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